OPINIÃO 125 - Sobre gatos, amigos e ansiedade...

 

ATENÇÃO, O TEXTO ABAIXO CONTÉM SPOILERS LEVES DE O GATO DE BOTAS 2.

O filme em animação “O Gato de Botas 2: O Último Pedido”, que está fazendo muito sucesso nos cinemas de todo mundo, além de ser uma obra lindíssima do ponto de vista estético/visual, conta uma história divertida e muito bonita, carregada de simbologias e subtextos interessantes. Sem revelar muito sobre a trama, posso dizer que é uma jornada em busca de um sentido para a vida. Não estou falando apenas do protagonista, pois além do Gato de Botas, todos os demais personagens, de uma forma ou outra, estão procurando o mesmo.

No final do primeiro ato do filme temos a sensação de que o tema proposto pelo roteirista é a luta do Gato contra a morte. Esta peça pregada pelo roteiro é proposital, pois o que todos estão buscando ali é justamente perceber o quanto de felicidade possuem na vida que têm. Ou seja, o filme fala sobre a vida, e tem muito a nos ensinar sobre ela.

O Gato de Botas 2 pode ser assistido por toda família, contudo, se trata daquele tipo de história que oferece percepções e sentimentos completamente diferentes conforme a idade e as experiências de quem assiste. Pode ser apenas uma comédia divertida ou uma rica oportunidade de se falar sobre temas sérios e relevantes. Vida e morte, ser ou ter, humildade, ganância, família. 

Para mim, uma das passagens mais significativas da animação, e que merece um olhar atento e amoroso, é o que cito a seguir.

ATENÇÃO! A seguir pode haver um spoiler leve sobre a trama de O Gato de Botas 2!

No início do segundo ato do filme, o destemido Gato de Botas se vê em apuros para enfrentar uma situação muito difícil, que foge ao seu controle, e é acometido por uma crise de ansiedade. Das brabas! E a direção da animação foi extremamente competente em mostrar o sofrimento por quem passa quem é acometido por este tipo de crise: a respiração ofegante e difícil, o olhar turvo, a dificuldade de racionalizar, focar ou concentrar-se em imagens simples, a incapacidade de mover-se ou comunicar-se, o medo implacável. Estava tudo ali. A situação de estresse que desencadeou o pico de ansiedade e paralisou nosso querido protagonista só foi superada com uma ajuda muito especial, conforme podemos ver no trecho abaixo:

 


Quem surge é Perrito. Um dos personagens mais surpreendentes e importantes da trama. Sua função é ser aquele amigo que está sempre disponível, que não transige em ajudar, que não espera nada em troca senão o retorno do próprio amor que dispensa a todos que estão à sua volta. Perrito é quem entende que não são necessárias nove vidas, como em um gato, mas apenas uma que seja plena de generosidade e carinho. Dono destas características tão nobres, chega até o Gato no momento mais difícil e não fala nada, apenas se coloca à disposição, oferecendo-se como abrigo.

Aí está a genialidade por traz desta passagem. O cãozinho não diz para o gato “sair dessa” ou então algo como “tu não precisas ficar assim”. Porque a pessoa que sofre com ansiedade gostaria de sair dessa, e muito, mesmo que ninguém lhe fale isso. Ninguém que é acometido deste tipo de sofrimento gostaria de ficar assim. Podes acreditar! Dizer para alguém que está em crise de ansiedade que ela não deveria estar é o mesmo que dizer para alguém que está resfriado que “não deveria espirrar, ou ter febre, ou ter dor no corpo...”. Ansiedade é uma doença. O tipo de doença que, se tu nunca tiveste contato pessoal com os sintomas, a única coisa que podes fazer é ingenuamente imaginar que apenas com força de vontade eles irão embora. 


Então temos a presença do Perrito, aquele que se doa ao amigo que sofre. Oferece sua companhia, sua amizade e põe o ritmo calmo de seu coração a bater junto ao acelerado coração do Gato. E é desta forma eles vão se equilibrando, apoiados um no outro, até que o protagonista reencontre a paz. Para o amigo cãozinho não foi necessário o uso de palavras de conforto ou conveniências, apenas fazer-se presente e disponível. Para mim, um dos momentos mais bonitos de O Gato de Botas.

O filme segue em direção a um terceiro e último ato tão empolgante quanto emocionante. Uma curiosidade: pela primeira vez tivemos no cinema nossos filhos de treze e seis anos igualmente felizes com uma mesma produção. Luna dava gargalhadas com Perrito e tremia de medo do vilão, enquanto Érico se divertia e se identificava com as questões que exigiam reflexão mais profunda, como esta relacionada à ansiedade, por exemplo. E nós, felizes por vê-los felizes, não podemos negar que também amamos O Gato de Botas 2, pois a narrativa é realmente maravilhosa.

Se ainda não levaram seus filhos para assistir, não percam a oportunidade. Ah! Não têm filhos? Não tem problema! Podem assistir porque a diversão é garantida.

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