Era
um típico galinheiro. Com todas as coisas que um galinheiro que se preze tinha,
a começar pelas galinhas. Várias galinhas de muitos tamanhos e cores
diferentes. Brancas, pretas, emplumadas, depenadas. Todas andando para lá e
para cá, fazendo aquilo que as galinhas faziam muito bem: cacarejando, comendo,
ciscando e pondo ovos.
Neste
galinheiro também havia um galo. Grande e forte, Sátrapa era o responsável por
colocar ordem no galinheiro. Controlava desde a posição das galinhas nos
poleiros, até a divisão justa do milho – afinal de contas, tinha de garantir
que galinhas que punham mais ovos mereciam comer mais e melhor. Muito
controlador, o poderoso galo determinava a hora de comer, dormir e pôr ovos. E
quem ousaria desafiar o cara que era responsável até mesmo por fazer o sol
nascer todos os dias? Ninguém, óbvio. Algumas penosas até pareciam admirá-lo,
mas na verdade o temiam.
Sátrapa
era a lei do galinheiro. Acreditava piamente na missão que recebera do
granjeiro, de manter a ordem e a harmonia entre as aves e garantir a
produtividade de ovos. Fiava-se com tanta intensidade e confiança na sua capacidade
como galo dominante, que não fazia outra coisa durante o dia senão andar
soberbamente por entre as galinhas, batendo asas aqui e cantando acolá.
Contudo,
foi justamente esta convicção em seu poder de liderança, e uma certa arrogância
típica dos galos, que fez com que sequer percebesse quando o granjeiro colocou
no galinheiro, entre as galinhas, um outro galo.
Antagôncio
não era um galo grande, na verdade parecia ser até menor que uma galinha.
Também não era muito bonito ou forte. Faltava algumas penas em alguns lugares
evidentes e andava de forma um tanto desengonçada. Não cantava muito bem e não
tinha pretensões de acordar nem um pinto, que dirá o sol. Invisível entre as
galinhas, permaneceu um bom tempo sem ser notado por Sátrapa, que se preocupava
muito mais em exibir as brilhantes penas e a crista colorida. Antagôncio, então
desfrutando este anonimato momentâneo, aproveitou para observar o galinheiro. Não
como o grande Sátrapa, mas de baixo para cima, de dentro para fora.
O
novato estranhou algumas coisas que aconteciam no galinheiro. Quando
o grande e poderoso Sátrapa se deu por conta de sua presença, já o encontrou
ciscando de galinha em galinha, querendo entender o que acontecia.
Primeiramente
Antagôncio achou bizarra a distribuição de milho feita pelo galo líder. Por que
as galinhas que põem mais ovos podem comer mais e melhor? Se elas já põem mais
ovos, o certo não seria distribuir mais comida justamente para aquelas que não
produzem tanto terem as mesmas condições de produção? A tática de Sátrapa
acabou dividindo as galinhas entre algumas poucas que comem bem e põem muitos
ovos, e a grande maioria, que não produz tanto justamente por estar mal
alimentada.
Outro
fato que chamou a atenção de Antagôncio foi a posição das aves no poleiro. Era
um poleiro triangular, com travessas de madeira onde as galinhas dormiam à
noite. Sátrapa, claro, dormia no ponto mais alto. No nível logo abaixo, algumas poucas galinhas campeãs em postura de ovos. Em
seguida aquelas que produziam um pouco menos. E assim sucessivamente, até
chegar na base, onde ficavam as galinhas que quase não punham ovos. Olhando
aquela pirâmide galinácea, Antagôncio percebeu que durante a noite, enquanto
dormiam, as aves iam fazendo suas necessidades umas sobre as outras. Sátrapa fazia nas galinhas que estavam no nível logo abaixo.
Estas, por sua vez, faziam nas próximas e assim por diante, até chegar nas
pobres galinhas da base, que recebiam toda noite um banho de caca, vindo de
todo poleiro. Para Antagôncio estava claro que as galinhas do nível inferior,
sujas e doentes, ficavam tão tristes que não tinham a menor vontade de pôr ovos
e, por esse motivo mesmo, ficavam sempre naquela posição ingrata, como um eterno castigo.
O galo recém chegado achou injusta esta distribuição e questionou as galinhas: Por que não faziam um rodízio na posição do poleiro, ou então porque
não colocavam o poleiro em outra posição, onde nenhuma galinha precisasse ficar
sob as demais. As galinhas da parte superior do poleiro refutaram a ideia imediatamente. Onde já se viu tamanha galinhagem com a gente???
Evidentemente
Sátrapa começou a ficar incomodado com a presença do bisbilhoteiro visitante.
Não que o pequeno e feio emplumado pudesse ofuscar sua liderança, mas pelo fato
de que as galinhas começavam a questionar suas decisões. Primeiro
tentou silenciá-lo fazendo muito barulho, batendo as asas e cantando de galo por
todo lado. Mas o escarcéu já não se mostrava suficiente, pois agora as galinhas, que começavam a se organizar em pequenos grupos, olhavam com desconfiança para o
grandão, que já pensava em uma nova estratégia para permanecer no comando.
Mesmo
reunindo as galinhas privilegiadas, melhores alimentadas e limpas, colocando-as
ao seu redor para tentar ser mais persuasivo diante das demais, não conseguia
sua atenção. Mais e mais Antagôncio despertava o interesse das galinhas menos
extraordinárias, que já não se limitavam a ouvir suas perguntas, mas que agora
começavam a questionar também.
Por
fim, o desesperado Sátrapa ameaçou Antagôncio, dizendo que iria prendê-lo em uma
gaiola ou colocá-lo para fora daquele galinheiro definitivamente. Que procurasse
outro, onde suas ideias questionadoras fossem aceitas como normais.
Ao perceber que não havia mais como desfazer o estrago causado pelo galo questionador, Sátrapa faz-se valer de sua força e tamanho avantajado. Inicialmente prende Antagôncio, acusando-o de tentar subverter a ordem e a harmonia no terreiro. Em seguida, o expulsa do galinheiro, cumprindo seu papel de líder.
Ao perceber que não havia mais como desfazer o estrago causado pelo galo questionador, Sátrapa faz-se valer de sua força e tamanho avantajado. Inicialmente prende Antagôncio, acusando-o de tentar subverter a ordem e a harmonia no terreiro. Em seguida, o expulsa do galinheiro, cumprindo seu papel de líder.
Era
tarde demais. As galinhas já não aceitavam os desmandos de Sátrapa. Em nome do
querido Antagôncio, passaram a exigir que todas as galinhas recebessem a mesma
quantidade de milho e dormissem em um poleiro que não distinguisse pela cor das
penas ou quantidade de ovos.
Furioso
e transtornado, Sátrapa sai desasado do galinheiro. Na manhã seguinte, para
surpresa de todas as galinhas, o sol surge no horizonte, lindo e brilhante, sem
que para isto fosse necessária a cantoria do grande e brilhante Sátrapa.
Às aves
que ficaram, uma única certeza: Sátrapa nunca mais! Ele não!
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Para quando escreveres o teu primeiro livro,já estou reservando com antecedência teu autógrafo. Leitura agradável.
ResponderExcluirOh... meu amigo querido! Muito obrigado pelo carinho!!! Sabe que vontade não falta... mas agora vamos ver se para lançar o livro não teremos que passá-lo pelo crivo, né? Abração!!!
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