OPINIÃO 120 - O Tempo


Hoje eu quase chorei na rua. Sentado em um banco de praça. Quase, porque o machista que ainda habita em algum cantinho de mim ficou soprando em meu ouvido que não deveria fazer isso assim, em público. É feio mostrar tamanha fragilidade, sabe? De vez em quando eu ouço seus gritos.

Saí do restaurante onde habitualmente almoço e, antes de começar o expediente da tarde, como de costume, sentei-me sozinho em um banco da praça que fica em frente à escola onde trabalho, em Porto Alegre. É uma praça bonita, com muitas árvores, pássaros, pessoas passando. No outono, estação em que estamos agora, ela parece ainda mais melancólica, remete a lembranças ainda mais emotivas.

Pois foi nessa praça, nestes mesmos bancos, que durante cinco anos, após o almoço, sentava com meu filho para esperar a van que o levaria para casa, depois da manhã de aula. Calma! Meu filho está bem. Segue crescendo lindo e esperto. Teimoso como uma mula (ou como eu?). Continuo o amando mais do que qualquer coisa no mundo.

O que fez tamanha tristeza se abater sobre mim foi justamente a lembrança de cada uma das etapas que passamos naquele lugar. Ele tinha seis anos quando, pela primeira vez, foi àquela praça comigo. Eu lembro como se fosse hoje! Andava atrás das pombas, vinha correndo e pulava no meu colo. Era um toco de gente, de cabelo penteado, bochechas vermelhas e ficava grudado em mim. Quando a van chegava, o levava pela mão, sentava no banco, afivelava o cinto, dava um beijo e me despedia. No segundo ano, lembro dele sem os dois dentes da frente; mais independente, já não corria atrás das aves, mas adorava juntar as sementes que caíam das árvores e me trazer, para mostrar a forma ou perguntar o que era. No terceiro ano, trazia consigo um livro da biblioteca para eu ficar lendo para ele enquanto o transporte não chegava. Nessa idade ele ainda sentava no meu colo. Quando estava no quarto ano, vez por outra um coleguinha da turma vinha esperar a van conosco; ficavam brincando, falando sobre games ou seus animes favoritos; riam alto, faziam caretas. No quinto e último ano desta fase, já “grandinho”, falava comigo sobre assuntos mais sérios, fazia perguntas sobre tudo; às vezes se chateava com alguma “chamada” que eu fazia; não sentava mais no meu colo, mas o beijo na despedida era indispensável. Para ambos!  Foram cinco anos assim, nós, o banco, a praça, os sorrisos.

Mas por que eu fiquei triste com uma lembrança tão bonita?

Me dei conta de que todas estas fases que passaram, ficaram em um lugar de onde jamais sairão. Nunca mais o verei correndo atrás de pombas, juntando sementes, sentando em meu colo para ouvir uma história. Nunca mais. E nunca é muito tempo.

O tempo é implacável. Vez por outra cruel. Sádico. Os acontecimentos mais simples de nossa vida, e por isso mesmo os mais bonitos, possuem um prazo de validade tão pequeno que, mesmo que os aproveitemos ao máximo, depois de um tempo não passarão de lembranças. 

São poucas as coisas na nossa vida pelas quais não podemos buscar alternativas para reviver, mas as mais mágicas, aquelas que fazem diferença de verdade, temos que vivê-las com o máximo de intensidade, pois em algum momento nos daremos conta que são apenas lembranças. E inevitavelmente não passarão disso. Como estas folhas caindo das árvores da praça. Perderão a cor, a energia, aos poucos se tornando apenas um vulto que vai se apagando no chão, junto de outras que um dia foram folhas.

Sei que o tempo renova, transforma e traz. Mas ele tira. Jamais teremos como ter certeza do que ele trará, mas sabemos perfeitamente quais coisas ele levará consigo para não nos trazer mais. E nesse momento, ele causa dor. Porque são exatamente aquelas coisas que mais nos fazem bem, que gostaríamos de ter eternamente junto de nós, as que irão para sempre. Sejam eles pessoas, momentos ou crianças correndo atrás de pombos.

Quer saber de uma coisa? Foda-se o machista que habita em algum cantinho de mim.








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